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terça-feira, 6 de maio de 2014

Nicotine


Flickr: sandymayra

Ela se sentia cansada
Suas telas haviam se tornado abstratas e já não faziam sentido algum. Rostos sem expressões eram temas comuns em suas pinturas. Maria achava que isso representava o vazio de seu peito.
A alguns meses havia retomado um de seus vícios mais antigos: os cigarros. Sempre foi assim, messes sem fumar e de repente, mais uma recaída. Adquiriu esse vício logo após a morte de seus pais, evento que marcou sua vida tanto quanto as cicatrizes em seu corpo.
A nicotina a deixava relaxada e o melhor, tirava toda sua fome. Ela amava o efeito dessa droga em seu organismo. A mantinha relaxada e até feliz, arrisco dizer.
Maria mantinha um ritual. Primeiro ascendia algumas velas, depois uns incensos. Bebericava uma taça de vinho barato e fumava um cigarro. Tudo isso sob a janela, olhando a Lua. Assim costumava passar as quintas-feiras, ao som de Beethoven. Sonata ao Luar era a favorita da noite.
Herdara o amor à música clássica graças a sua mãe, uma pianista de mãos delicadas e gargalhar epidêmico. Cabelos vermelhos e encaracolados e pele enferrujada.
Nesta noite de quinta, Maria decidiu que terminaria alguns de seus poemas, leria mais um de seus livros malacabados e tentaria dormir.
As 2 h da manhã Maria acordou com o som de uma ambulância, algo raro em seu pequeno bairro. O prédio todo havia acordado para prestigiar a ambulância que decidira lhes visitar.
Tudo que vira foram alguns peritos e outros policiais gorduchos. A depressão fizera mais uma vítima. Assustada, fechou a porta de supetão ao passo que sentira uma lufada de ar frio adentrando o minúsculo apartamento.
As luzes piscaram e Maria percebeu. Ela havia voltado.